quarta-feira, 27 de janeiro de 2016

Metálico

Me deixa triste lembrar da tua solidão
Da tua casa tão pequena e abafada
Um calor, um odor impregnado

Me causa melancolia pensar em ti
Em tudo que tu podia oferecer a alguém
Em saber que alguém não há

Em dias como hoje, sinto um pouco de culpa
Dessas culpas hipocritas que sentimos em avulso
Dessas coisas no peito que mais parecerem estar na consciência moral

Te estrago em meus pensamentos estragados
Por sentir tão mediocre
E por silenciar, com indiferença explicita

sexta-feira, 22 de janeiro de 2016

Religando

Quem iria querer se esquivar do céu
Ele está ali, acima de nossas cabeças, na linha do horizonte
Tanta beleza, sublime como algo saboroso que desmancha na boca
E eu, tão pequeno, arrebatado

À tarde, enquanto os pássaros voavam pelo céu do PICI
E os carneiros brincavam feito criança
Vi um avião planear pelo céu, riscando-o em traço, linha reta
Sentado sobre o carro, apenas observava admirado, espantado

Me senti criança, homem, mulher, me senti ser-humano
Ali, parado, sem ter com o que me preocupar, saúde, doença, não importava
Apenas fui feliz, feliz apenas por ser, por existir, por fazer parte de um todo
Homens sérios e racionais podem até ter mais, mas homens-meninos é que são mais.

quinta-feira, 21 de janeiro de 2016

Triangular

quando menino gostava de inventar histórias de aventuras
propor fugas fugazes aos meus amigos, explorar terrenos esquecidos, terras de ninguém
gostava de acordar bem cedo e ver o fim do jornal antes dos desenhos
de inventar os clubes mais bobos possível e assistir trilogias de terror com os mais medrosos

quando rapaz gostava de ficar sozinho à noite
me balançar numa rede e ouvir qualquer mpb sentimental que eu tivesse
gostava de expurgar minha raiva e minha tristeza enquanto dançava
de pensar que tinha um amigo e um sonho em cada lugar da cidade

na escola eu não queria saber mais do que ninguém, queria apenas fazer parte
na rua queria inovar em cada brincadeira antiga e tradicional
na cidade da minha avó ser o menino mais louco
nas férias na praia o melhor jogador de sinuca e contador de histórias na madrugada

anos e anos e anos e fui me misturando, sendo tudo que era, não sendo mais, me tornando algo novo, algo duro, quase amargo
"casca grossa, mas por dentro o recheio é macio e quente" você disse
no ir e vir de todas as sensações encontrei uma espécie de segurança pedante em relação a quem eu era, ao que eu conseguia fazer quando realmente queria alguma coisa, me apoiei na habilidade de me fazer desejado, atraente, objetivo
em contrapartida, no ir e vir de tantos sentimentos passei a acreditar que eu não merecia ser amado
que não era bom o suficiente para fazer alguém ficar, para ser visto por inteiro, para ser totalmente honesto

hoje eu consigo ver além dos véus que cobriam meus olhos
consigo perceber o que ignoro e ao que me apego, um punhado grande de tolices
hoje permito a honestidade com quem for, mais vale uma gentileza que um joguinho
hoje sei que mereço tudo, que não preciso me apoiar no que é superficial, mas apenas ser de verdade
hoje não quero sumir, quero somar
não quero quem vem pela metade, quem inventa desculpas,

quero o que vem livre, por inteiro, de bom grado
quero o que some e não suma
quero o que é doce e me faz doce
quero o que me sorri e me faz sorri de volta
quero o que faz eu me perder no tempo e se perde junto comigo
quero o que se faz presente, como um presente
quero o que me torna uma pessoa melhor

quero
e quando não tenho, apenas sou, sem amargor, sem ignorância ou apegos
eu, menino, homem, menino

Central

deixa a vida ser e acontecer
como tiver de ser, em fluxo, fluído
deixa que as águas te levem, mornas ou frias
deixa se banhar, deixa limpar

ontem, amanhã, o que importa
entre as coisas que merecem atenção
valorize o que não se pode perder
a riqueza essencial que está lá no fundo

vai correndo atrás desse teu hoje

deixar a vida ser

deixar e acontecer junto com ela


quarta-feira, 20 de janeiro de 2016

Palpitações

que gira, que gira e para
que inquieta, que inquieta e aquieta
que grita, que grita em silêncios

silêncios crus, silêncios nus
de palpitações, precipitações, soluções
do tempo que passa, do fogo que queima, da marca que deixa

vítimas e culpados, tocados, mexidos
deixados de lado, entrelaçados
vítima de mim, vítima de você

quando a porta se abre e você entra, quando a porta se abre e ali estou eu. Tenho medo até de pronunciar o que penso, tenho medo até de não ter medo de nada.

efervescências no peito, queimação do estômago
quando eu me for, onde será que estarei, chegarei, ficarei
quando você se for, o quão longe estará?

e tudo isso por fugir do instante presente, de recusar o presente dado, de evitar o pensamento de que possa estar, possa acontecer, ser. Tudo isso por sentir em demasia o que não recordava-se então. 

terça-feira, 19 de janeiro de 2016

Mais do mesmo

O que me entrega os dias?
O que entrego aos dias?
Em que me entrego
Como me desmancho pelas mãos do tempo

Debaixo desse sol que me derrete
E aquece essa minha carne fria
De mãos geladas, pareço menino fraquinho
Fracote, bobinho, sem força

No coração farpas de gelo,
homem feito ou homem tolo
Viciado em insistir nos mesmos medos
Inocente, ingênuo e bem perigoso

Visceral escondido no ínfimo
Perdido, preenchido, quase explodindo de palavras, de quereres, de anseios
De tudo e de nada
De tédio e de...

sexta-feira, 15 de janeiro de 2016

Espaço oco e os vazios

Hoje acordei como se algo estivesse fora do lugar
Não sei dizer o que odeio mais, constância ou a falta dela
Me pego preso pelos dias, pelo que sinto, pelo o que penso
E então me percebo em uma montanha russa, hora está
hora não está, nem paz, nem alegria, nem nada disso.

Me pergunto por quais ruas e esquinas encontro o resto
Olho no espelho e tento enxergar através, como uma cena
Um cena clichê de filme antigo, ou remake
Não encontro respostas, apenas esperas, quem sabe uma afirmação:
Tudo isso acontece dentro de você e por sua causa.

Aponto culpados e descubro que o perdão mais difícil é o que temos que dar a nós mesmos
Quando tudo está em minhas mãos, é torturante largar a responsabilidade
Fico parado, friso tudo que é ruim e caio no chão vazio,
como uma fruta que se espatifa embaixo de sua árvore
Logo, então, rogo por salvação, das minhas entranhas, de tudo o que ferve dentro de mim.

quinta-feira, 14 de janeiro de 2016

Le parole sono la metá

Palavras, palavras, palavras, palavras
palavras, palavras, palavras, palavras
Leia novamente: palavras, palavras
Palavras são apenas palavras, um conjunto de letras
Uma junção desimportante que as vezes nada diz.
O que importa é o ímpeto, aquilo que aperta teu peito,
se empurra pelo pescoço e explode na garganta, língua, dentes, lábios, boca...
ou apenas cintila nos dedos.

Sentir é só mais uma palavra e eu me pergunto o que ela realmente significa
Significado, medo, alento... palavras.
Talvez isso tudo seja apenas um devaneio, um ouvido cheio de palavras de Cássia
Ou talvez eu queira parar de dizer e apenas deixar ser, chegar de outra forma.
Como se eu quisesse te alcançar em cheio, achar tua fonte escondida,
me lançar, te laçar,
boca, nuca, mão, mente e "o corpo inteiro feito furacão".

Te arder como fogo e te mergulhar como água...
Nos esbaldar

quinta-feira, 7 de janeiro de 2016

Castelo de cartas

Um instante, apenas um instante 
Alguns segundos, rápidos, imperceptíveis
E ali está o invasor, tomando posse

Apenas um instante e alguém se torna parte
Agrega-se a sua vida como se sempre tivesse feito parte
Parte, todo, pedaços, de mim, de nós, de outros

Um instante e o que era já não é mais
Um instante, alguns segundos, até ser
Mais um instante para não existir, ou fingir.


Desplugando

Então, o silêncio é de ouro
A palavra é de prata
E os sentimentos são como um mar que se torna agressivo
Ou apenas flui calmamente

E eu,  como o mar, de acordo com a lua
Sigo sazonal, em minha própria confusão
Hora de ouro, hora como um pedaço de vil metal
Assim recomeço, lotado de sacolas, bolsas, pesos
Deixando coisas pelos caminhos

Abandonando culpas, medos, deixando pelo chão os sentimentos
Aquilo que não cabe mais, não serve mais
Ano solar requer mais somas e multiplicações
Mas antes de vir o novo, é preciso cuidar do velho.

A última olhada para trás

 Eu ainda amo  Ainda amo e amo ainda Há muito tempo Há muitos anos Há muitas vidas  Eu sinto isso em mim No estômago, no peito, nos olhos No...